terça-feira, 13 de março de 2018

Resolução sobre tática e organização

(versão para debate e aprovação no secretariado nacional)

Este texto foi elaborado por uma comissão indicada pela Direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda (AE), em reunião realizada na cidade de Recife (PE), no final de janeiro de 2018. Nos dias 23 e 24 de março o secretariado nacional da AE debaterá o texto e as emendas apresentadas pela militância, consolidando uma versão final que servirá de texto-base do debate na segunda etapa do 4º Congresso.

Introdução

1.A tendência petista Articulação de Esquerda realizou, de 24 a 26 de novembro de 2017, a primeira etapa do seu 4º Congresso Nacional, tendo como único ponto de pauta o debate sobre a estratégia da luta pelo socialismo no Brasil. E convocamos – para os dias 4, 5 e 6 de maio de 2018 – uma segunda etapa do Congresso, com novas delegações eleitas com esta finalidade, para debater assuntos de tática e organização.

2.A pauta desta segunda etapa inclui quatro temas interligados:

a)o atual momento da luta de classes, no Brasil e no mundo;
b)a tática de nossa atuação nas lutas sociais, na disputa eleitoral e na batalha cultural;
c)os nossos objetivos na construção e disputa de rumos do PT;
d)a construção da tendência petista Articulação de Esquerda.

3.O ponto de partida da discussão sobre estes quatro temas é a resolução sobre programa e estratégia aprovada na primeira etapa do 4º Congresso. Aquela resolução aborda:

a) as tendências do desenvolvimento do capitalismo no século XXI, ou seja, a análise dos conflitos atuais entre os Estados e entre as classes sociais, tanto no mundo quanto no Brasil;

b) o programa e a estratégia que a classe trabalhadora brasileira deve defender, para enfrentar e derrotar a classe dos capitalistas, superar o capitalismo e o imperialismo, dar início à transição socialista em direção a uma sociedade comunista;

c) a crítica à atual estratégia do Partido dos Trabalhadores, baseada na mudança sem rupturas estruturais, e a demonstração de que o enfrentamento dos desafios conjunturais exige não apenas uma tática adequada, mas também uma tática articulada com uma nova estratégia, baseada na mudança através das rupturas estruturais, e com uma nova política de organização, que recupere os laços cotidianos do PT com a classe trabalhadora.

4.A segunda etapa do 4º Congresso da tendência petista Articulação de Esquerda tem como objetivo detalhar esta nova tática e também esta política de organização, assuntos que abordamos no presente projeto de resolução.

Conjuntura

5.A conjuntura brasileira é composta por todos os conflitos entre as classes e frações das classes sociais, nos planos cultural, econômico, social, político e militar. Estes conflitos, por sua vez, estão vinculados aos conflitos em curso na região América Latina e no mundo como um todo.

6.Portanto, o primeiro desafio a enfrentar quando fazemos a análise da conjuntura é determinar qual o “fio” que seguiremos para nos orientar neste labirinto de conflitos. Dito de outra maneira, nosso primeiro desafio é descobrir quais são – entre os vários existentes – os conflitos decisivos, aqueles são capazes de definir o rumo geral dos acontecimentos.

7.O conflito decisivo é o que se trava entre a classe capitalista e a classe trabalhadora, para redefinir qual o padrão da exploração capitalista no Brasil. Portanto, o conflito decisivo inclui a definição dos salários, da aposentadoria, da legislação trabalhista, das políticas sociais etc.

8.O resultado global do conflito entre a classe capitalista e a classe trabalhadora vai definir os aspectos essenciais da correlação estrutural de forças entre as classes sociais, o tipo de desenvolvimento capitalista que teremos no Brasil pelos próximos anos e décadas etc. Ou seja, o desfecho dos demais conflitos envolvendo os diversos setores explorados e oprimidos do povo está vinculado e sobredeterminado pelo desfecho do conflito decisivo entre capital e trabalho e dele dependem.

9.Para vencer o conflito contra a classe trabalhadora, a classe capitalista adotou, entre 2003 e 2010, a combinação entre duas políticas: por um lado, fez enfrentamento e oposição aos movimentos, partidos, governos e ideias da classe trabalhadora; por outro lado, buscou cooptar e influenciar os representantes governamentais, parlamentares, partidários, sociais e intelectuais da classe trabalhadora.

10.Estas duas políticas expressavam, em certa medida, os diferentes interesses existentes na própria classe dos capitalistas. E contribuíram para reforçar, na classe trabalhadora, aquelas posições que partiam do pressuposto de que era possível uma coexistência conflituosa, mas dentro de regras previsíveis, com a classe dos capitalistas. A partir de 2011, entretanto, o conjunto da classe dos capitalistas foi se unificando em torno de uma só política: enfrentar e derrotar, dentro das regras se possível, fora das regras se necessário. Esta política quase teve êxito nas eleições presidenciais de 2014. E teve êxito no golpe de 2016.

11.O programa do golpe de 2016 tem três dimensões fundamentais: realinhar o Brasil aos interesses geopolíticos dos Estados Unidos, reduzir as liberdades democráticas e ampliar a exploração da classe trabalhadora. A aliança com os EUA e a redução das liberdades são meios que contribuem para este fim: ampliar a exploração da classe trabalhadora.

12.Há dois obstáculos fundamentais para a implementação do programa golpista: o primeiro obstáculo é a turbulência internacional, cuja análise é feita no documento aprovado na primeira etapa do 4º Congresso da tendência petista Articulação de Esquerda; o segundo obstáculo é a resistência da classe trabalhadora, também abordada naquele documento e sobre a qual falaremos mais a seguir.

13.Apesar de imensa derrota sofrida em 2016, a classe trabalhadora manteve a mobilização e a luta, expressas na greve geral, nos dias nacionais de luta, nas mobilizações por todo o país, na criação da Frente Brasil Popular e, inclusive, nos desfiles de Carnaval. Nada disto foi o suficiente para derrotar o golpismo nas lutas e nas ruas; mas foi o suficiente, por exemplo, para colocar em dúvida a possibilidade de aprovar, no Congresso Nacional, a antirreforma da previdência. A mobilização e a luta da classe trabalhadora são o pano de fundo, também, das divisões táticas existentes entre os golpistas, inclusive acerca das candidaturas presidenciais. Da mesma forma, a mobilização e a luta da classe trabalhadora contribuem decisivamente para que o presidente Lula siga liderando as pesquisas de opinião.

14.Assim, a questão tática central para a classe dos capitalistas consiste em derrotar a capacidade de mobilização e luta da classe trabalhadora. Só assim eles conseguirão afastar o risco de uma derrota e reversão do golpismo e de seu programa antinacional, antidemocrático e antipopular.

15.Para atingir este objetivo, a classe dos capitalistas e seus representantes políticos e culturais vinham implementando, até o Carnaval de 2018, dois movimentos simultâneos:

a)o primeiro movimento consistia (e consiste) em implementar a reforma trabalhista “pela base”, ampliando a exploração e a dominação desde o local de trabalho. Este tema está detalhado na resolução da plenária sindical nacional da AE, que será realizada nos dias 3 e 4 de maio de 2018, na véspera da segunda etapa do 4º Congresso;

b)o segundo movimento consistia (e consiste) em impedir que Lula participe da campanha eleitoral de 2018;

16.Apesar da campanha midiática, do golpe e da condenação, Lula segue liderando as pesquisas de opinião e tem grandes chances de vencer as eleições de 2018. É por isso que os golpistas precisam impedir que Lula participe destas eleições. Não basta impedir que Lula seja candidato; os golpistas precisam, também, impedir que ele participe da campanha eleitoral. Para isto, não é suficiente negar o registro da candidatura. Os golpistas precisam prender Lula. Esta foi a decisão de Moro, do TRF4 e da turma de julgadores do STJ. Quanto ao Supremo Tribunal Federal, o cenário mais provável – no momento em que estamos redigindo este documento – é que o STF não impeça a execução imediata da pena. Neste caso, Lula será preso, terá seu registro de candidatura negado e poderia ser impedido de participar da campanha, até mesmo enquanto apoiador.

17.Reiteramos aqui o que já dissemos noutras oportunidades: caso os golpistas prendam Lula, a esquerda brasileira tem a obrigação política de reagir com ações de desobediência civil, a começar pela resistência à prisão.

18.Mesmo que não prevaleça este cenário, ou seja, mesmo que Lula não seja preso, a tendência é que o Tribunal Superior Eleitoral negue o registro de sua candidatura. Claro que se fosse respeitada a legislação e a jurisprudência, Lula poderia disputar a eleição e o deferimento ou indeferimento definitivo do registro da candidatura ocorreriam apenas no final da campanha ou até mesmo depois do processo eleitoral. Mas tudo indica que o TSE – fiel ao “Estado da direita”--, atropelará a jurisprudência e a legislação, impedindo que o nome de Lula esteja na urna eletrônica.

19.Impedir Lula de participar da campanha eleitoral – como candidato e/ou como apoiador – é o suficiente para impedir que a resistência da classe trabalhadora se converta numa vitória eleitoral em 2018. Nenhuma outra candidatura de esquerda e/ou de centro-esquerda tem condições de disputar com chance de vitória. Na melhor das hipóteses, outras candidaturas poderão denunciar a fraude e acumular forças para disputas futuras. Mas, ao participar de uma eleição sem Lula, as demais candidaturas estarão na prática legitimando uma fraude eleitoral.

20.Embora só possam ter certeza de ganhar a eleição de 2018 se fizerem isso, é fato também que impedir Lula produzirá dois efeitos colaterais negativos de curto e médio prazo para os capitalistas e seus representantes políticos. O primeiro efeito colateral negativo será o de ampliar a disputa entre as diferentes candidaturas golpistas. O segundo efeito colateral negativo será o de ampliar a ilegitimidade do sistema político eleitoral brasileiro.

21.Bolsonaro, a candidatura golpista melhor pontuada nas pesquisas de opinião está longe de ser a candidatura preferida pelo conjunto das forças golpistas, mas nem por isso deve ser menosprezada. Esta candidatura, como já vem sendo indicado pelas pesquisas, pode inclusive ser eleitoralmente beneficiada caso Lula seja impedido. Portanto, impedir Lula de disputar as eleições terá como efeito ampliar a disputa entre as diferentes candidaturas golpistas. A depender da amplitude desta disputa, pode ocorrer um segundo turno entre a direita e a extrema direita.

22.As já citadas pesquisas indicam que 50% do eleitorado ainda não escolheu em quem vai votar. O número de votos em branco, nulos e abstenções tem sido significativo, inclusive nas eleições presidenciais. E outras pesquisas apontam o desprestígio crescente das instituições políticas. Caso Lula seja preso e impedido de participar do processo eleitoral, inclusive enquanto apoiador, é possível que o voto de protesto seja ainda mais significativo – o que afetará a legitimidade do presidente que vier a ser eleito em 2018 e, consequentemente, também a sua governabilidade. É por isso, aliás, que o oligopólio da mídia concede espaço generoso para algumas candidaturas da esquerda e centro-esquerda: trata-se de uma tentativa de encobrir a fraude e, ao mesmo tempo, reduzir o déficit de legitimidade de uma eleição previamente fraudada.

23.É neste contexto que deve ser compreendida a intervenção militar no estado do Rio de Janeiro, a nomeação de militares para postos importantes do governo Temer e, de maneira mais ampla, os apelos por uma intervenção militar nacional.

24.Claro que as motivações estritamente políticas (mudar a pauta, desviar a atenção, recuperar a iniciativa) e eleitorais (cacifar Temer) são parte importante dos motivos que levaram o governo federal, em conluio com o governo estadual, a decidir pela intervenção militar no estado do Rio de Janeiro.

25.Claro, também, que a intervenção – e portanto os objetivos políticos e eleitorais que se pretende alcançar através dela – tem tudo para resultar num fracasso. É verdade que a pauta da segurança, assim como ontem a da corrupção, tem forte apelo popular. Mas é muito mais fácil começar do que concluir com êxito uma intervenção militar na segurança pública, como demonstram várias experiências no próprio Rio de Janeiro e o caso mexicano. As dificuldades são tantas que há quem especule sobre um acordo entre o governo Temer e o PCC. Acima de tudo, a intervenção significa uma ameaça para as liberdades democráticas e para a vida de parte importante da população pobre e trabalhadora do Rio de Janeiro, sobretudo a que vive nas favelas, alvo principal das investidas militares, existindo ou não intervenção. Não está evidente quem será o maior beneficiário, eleitoralmente falando, da intervenção: Temer? Bolsonaro? Alckmin? Outra candidatura golpista? Portanto, do ponto de vista político e eleitoral imediato, a intervenção militar constitui uma operação de altíssimo risco, não apenas para Temer, mas também para as Forças Armadas. O que contribui para a existência de questionamentos entre os próprios militares.

26.Entretanto, quando observamos o cenário de conjunto, percebe-se que a intervenção militar é um ingrediente a mais no ambiente de cerceamento das liberdades democráticas, de repressão aos movimentos sociais, de ataque contra as ideias democráticas, populares e socialistas. Dito de outra forma, a intervenção militar no Rio de Janeiro é mais um passo no sentido de substituir a legitimação democrática dos governantes, através de processos eleitorais; pela legitimação não democrática dos governantes, através de operações midiáticas, da força bruta e do medo.


Tática geral

27.Na atual conjuntura, a tática adotada pelo Partido dos Trabalhadores não pode perder de vista que o conflito fundamental se trava entre a classe capitalista e a classe trabalhadora, para redefinir qual o padrão da exploração capitalista no Brasil. É este conflito fundamental, entre capital e trabalho, que subordina os conflitos entre nação e imperialismo, entre democracia e ditadura. Para os capitalistas, o ataque às liberdades democráticas e as concessões ao imperialismo não são um fim em si, mas sim um meio para ampliar a exploração da classe trabalhadora. Por isso, o conjunto das frações burguesas, mesmo aquelas em tese prejudicadas pelo imperialismo, pelo neoliberalismo, pelas restrições às liberdades democráticas, apoiaram o golpe e o essencial das medidas golpistas. E, invertendo o ponto de vista, por isso a luta em defesa das liberdades democráticas e a luta em defesa da soberania nacional devem estar conectadas e subordinadas à luta em defesa dos direitos da classe trabalhadora.

28.Por isto a defesa do direito de Lula ser candidato e a defesa da candidatura Lula devem estar à serviço e totalmente vinculadas à luta em defesa dos direitos da classe trabalhadora. Por isto o programa de governo 2018 deve destacar um plano de emergência, para retomar o crescimento, gerar empregos e retomar as políticas sociais e a revogação das medidas adotadas pelos golpistas, o que por sua vez se vincula à necessidade de uma Assembleia Nacional Constituinte. Por isto a política de alianças do PT nas lutas sociais e nas eleições de 2018 tem, como divisor de águas, quem apoiou e quem não apoiou o golpe e as medidas golpistas contra a classe trabalhadora. Por isso nossa tática na eleição presidencial de 2018 tem como critério o que acumula mais ou menos para a luta geral da classe trabalhadora, hoje e no médio prazo.

29.Para a classe trabalhadora, o melhor desfecho em 2018 é a eleição de Lula presidente. Esta não é a opinião, evidentemente, daqueles setores da esquerda e centro-esquerda que decidiram lançar candidaturas próprias. Mas é a opinião do PT, para quem eleição sem Lula é fraude.

30.Então, o que fazer se a fraude se materializar? Caso Lula possa participar da campanha, mas seja impedido de ser candidato, será possível transferir votos para outra candidatura? E caso Lula não possa nem mesmo participar da campanha, por estar preso?

31.Esta é uma discussão difícil, primeiro, porque o PT, a esquerda e a classe trabalhadora se acostumaram, desde os anos 1980, a participar dos processos eleitorais lançando candidaturas próprias. Poucas vezes, nestes quase 40 anos, o PT chamou voto nulo, branco ou abstenção, mesmo nos segundos turnos. Isto faz com que, mesmo entre os que reconhecem que houve uma mudança qualitativa no cenário político, mesmo entre os que reconhecem que estamos diante do risco de legitimar uma fraude, haja enorme dúvida e resistência frente a hipótese de dar consequência prática e definitiva à palavra de ordem eleição sem Lula é fraude.

32.Outro motivo pelo qual trata-se de uma discussão difícil é porque são imensas as ilusões, no PT e na esquerda, acerca da real disposição da classe dos capitalistas. Ilusões na mídia, nos políticos de centro e direita, nos diferentes setores do poder judiciário, na postura dos empresários, na postura do comando das forças armadas, fazem com que se acredite que – mesmo sem Lula candidato, mesmo com Lula preso – seria possível fazer aquilo que já seria difícil mesmo com Lula solto e candidato: ganhar as eleições presidenciais.

33.Pelos dois motivos acima descritos, mas também por outras razões, apesar da resolução do Diretório Nacional do PT afirmar que eleição sem Lula é fraude, reafirmar a candidatura Lula e descartar qualquer tipo de “plano B”, lideranças e setores do Partido se movimentam em favor de uma alternativa, inclusive sobre a forma de uma eventual disputa da indicação da vice-presidência na chapa de Lula para “herdar” a candidatura à presidência caso o TSE casse o registro de Lula.

34.Caso a fraude se consume, caso Lula seja impedido de ser candidato e/ou seja impedido de fazer campanha, a posição que a tendência petista Articulação de Esquerda apresentará para debate e deliberação no Partido é a seguinte: as candidaturas do PT às Assembleias legislativas, à Câmara federal, ao Senado e aos governos estaduais defenderão publicamente que para presidente vamos votar Lula 13, em protesto contra a fraude. E buscaremos que a mesma postura seja adotada por todos os setores que se opuseram ao golpe, para propor uma campanha unificada de voto Lula 13 para presidente.
35.Caso a fraude se consume, então o resultado da eleição já estará pré-definido: a eleição de um presidente golpista. Portanto, a melhor tática a adotar neste caso é aquela que melhor nos posicione para fazer oposição, aquela que nos permita deslegitimar desde antes e desde sempre o governo resultante de uma fraude eleitoral. Não se trata, portanto, de um “boicote às eleições”, mas sim de votar 13 para presidente, numa resposta à fraude que está em curso na eleição presidencial. Uma orientação tão extraordinária, quanto é extraordinária a situação que estamos vivendo.

36.É provável que esta posição não seja adotada pela maioria de nossos aliados de esquerda e centro. E não sabemos se uma abstenção ganhará caráter de protesto de massa. O PT corre o risco, portanto, de sofrer um “certo isolamento institucional”. Se isto efetivamente ocorrer, não terá sido a primeira vez na história do Partido dos Trabalhadores. Nossa tática eleitoral no período 1982 a 1988 também sofreu muitas críticas da parte de outros setores da esquerda. Nossa posição frente ao Colégio Eleitoral também não foi acompanhada por nenhum outro partido da esquerda. Nossa crítica ao Plano Cruzado foi duramente questionada. Igualmente criticaram nossa decisão de não votar, embora assinando, a versão final da Constituição de 1988. Até pode ser que estivéssemos errados em algumas destas situações, mas o que elas demonstram quando examinadas de conjunto é que, em certas circunstâncias, algum isolamento pode ser um preço a pagar.

37.Não por coincidência, as situações citadas anteriormente ocorreram na década de 1980, na transição entre a Ditadura Militar e os governos neoliberais. Hoje também estamos vivendo um período de transição. No limite, esta transição pode resultar numa “ditadura neoliberal” ou pode resultar num governo democrático e popular. Neste contexto de transição, é previsível que parte da esquerda se aferre à estratégia, às táticas e às políticas de alianças adotadas no período histórico que está se encerrando. Algo parecido ocorreu durante a transição dos anos 1980: naquela época, enquanto o PT se projetava como força independente, outra parte da esquerda se aferrava à condição de aliada (subordinada) dos liberais do PMDB. Em alguns momentos, o PT pareceu (ou estava mesmo) isolado. Mas no final das contas, aquele “isolamento” virou apenas uma espécie de “dano colateral” resultante do posicionamento firme que permitiu ao PT se projetar, perante grande parte da classe trabalhadora, como a principal força de esquerda que fazia oposição ao neoliberalismo, sem o que nunca teríamos chegado ao governo federal.

38.Para citar um exemplo oposto: a capitulação do setor hegemônico da esquerda em 1964 contribuiu para consolidar o golpe militar, mas também contribuiu para a fragmentação da esquerda no período seguinte. Fragmentação que incluiu, anos depois, como uma espécie de reação tardia frente à desmoralização, a opção de parte da esquerda por uma luta armada sem base popular.

38.Em sentido oposto ao que ocorreu em 1964 e de maneira similar ao que ocorreu nos anos 1980, no atual período de transição o PT precisa radicalizar. Para vencer no curto prazo, elegendo Lula e fazendo um governo de transformação, precisamos radicalizar. E se formos derrotados, ter radicalizado permitirá que nos mantenhamos como a principal força de oposição, criando assim melhores condições para uma vitória da esquerda, num momento seguinte. Radicalizar é preciso, ademais, porque uma coisa é certa: na transição que estamos vivendo e no que virá depois, em nenhuma hipótese prevalecerá a “conciliação de classes”.

40.Se conseguirmos registrar Lula dia 15 de agosto e sua candidatura estiver na urna eletrônica, nosso desafio será o de ganhar as eleições presidenciais, eleger Lula, garantir a posse e governar num cenário muito mais difícil do que em 2003, 2007, 2011 e 2015. Um cenário em que precisaremos ter cada vez mais firmeza na defesa de nosso projeto democrático-popular e socialista; acerca dos motivos que nos levam a repudiar a tática eleitoral intitulada de “plano B”; acerca das razões não apenas táticas, mas também estratégicas, pelas quais defendemos, em qualquer cenário, votar em Lula 13 para presidente. Um cenário no qual só triunfaremos, se formos capazes de recuperar nosso apoio junto a classe trabalhadora, retomar nossa inserção organizada junto aos mais diferentes movimentos sociais, modificar profundamente o funcionamento do Partido.

41.Finalmente: se é verdade que devemos discutir o que fazer no pior dos casos, também é verdade que devemos fazer tudo o que for possível para impedir que o pior dos cenários se materialize. Isto inclui insistir na linha aprovada pelo Diretório Nacional do PT em 16/12/2017: Nada de “plano B”: eleição sem Lula é fraude! E continuar na luta em defesa da soberania nacional, das liberdades democráticas e dos direitos sociais.

Tática eleitoral

42.A segunda etapa do 4º Congresso nacional da AE homologa a resolução sobre tática eleitoral, aprovada pela Direção nacional na reunião de Recife.

43.A segunda etapa do 4º Congresso nacional da AE tomou conhecimento e aprovou moções de apoio à tática eleitoral e as candidaturas apoiadas pela AE nos estados.

Tática na luta social

44.A segunda etapa do 4º Congresso nacional da AE homologa a resolução aprovada pela plenária sindical nacional da AE, realizada nos dias 3 e 4 de maio de 2018.

45.A segunda etapa do 4º Congresso nacional homologa a resolução aprovada pela conferência nacional da Juventude da AE, realizada nos dias 3 e 4 de março de 2018.

46.A resolução sindical e a resolução da juventude, assim como a resolução eleitoral e as moções de apoio à nossas candidaturas, serão publicadas como parte das resoluções do 4º Congresso da tendência petista Articulação de Esquerda.

47.A segunda etapa do 4º Congresso nacional da AE encarrega a nova Direção nacional de convocar plenárias nacional específicas da militância da AE que atua nos seguintes movimentos: movimentos populares urbanos e de luta por moradia; movimentos de luta pela terra e de pequenos proprietários camponeses; movimentos de organização dos negros e das negras e de luta por políticas antirracistas da AE; movimentos de luta contra a LGBTfobia e na organização dos e das LGBTT; movimentos de direitos humanos; movimentos ambientais; movimento cultural e dos trabalhadores da arte e da cultura. Cabe à Dnae convocar e acompanhar cada uma destas plenárias, debater o texto base e homologar a resolução final.

Tática na luta pelos direitos das mulheres
48.Conforme detalhado na resolução da primeira etapa do 4º congresso da AE, nós lutamos contra o capitalismo e também contra o patriarcado, que é uma forma de exploração e opressão anterior ao capitalismo.
49.As mulheres trabalhadoras são exploradas pelos capitalistas, inclusive por mulheres capitalistas. As burguesas lutam contra os direitos trabalhistas, contra os direitos sociais, contra os direitos civis da classe trabalhadora, para defender seus interesses de classe, sabendo que as maiores prejudicadas serão as mulheres da classe trabalhadora.
50.Portanto, para defender de maneira consequente o direito das mulheres, é preciso lutar contra o capitalismo. A solidariedade entre as mulheres trabalhadoras é nossa resposta ao apoio que as mulheres capitalistas dão à exploração dos trabalhadores e das trabalhadoras.
51.Articular a luta feminista e a luta socialista, articular a luta das mulheres e a luta do conjunto da classe trabalhadora, é necessário para que mais da metade da humanidade participe e esteja à frente das batalhas para pôr fim ao capitalismo e ao machismo.
52.Do mesmo modo que a emancipação da classe trabalhadora será obra da própria classe trabalhadora, a emancipação das mulheres será obra das próprias mulheres, tendo as mulheres trabalhadoras como direção e vanguarda do processo, pois são as únicas que podem ser consequentes nesta luta.
53.A luta contra o patriarcado é anterior ao capitalismo e vai continuar sendo necessária no socialismo. Entretanto, isso não significa que a luta pelo socialismo seja algo menor. Afinal, não haverá vitória completa contra o patriarcado se não houver vitória completa contra o capitalismo.
54.Em relação as mulheres brasileiras, podemos afirmar que elas foram as mais impactadas ou beneficiadas por diversas das políticas sociais dos governos Lula e Dilma, justamente porque as mulheres compõem o segmento social mais empobrecido, precarizado e excluído da sociedade brasileira, com destaque para as mulheres negras.
55.Mas as desigualdades entre homens e mulheres não foram, nem de longe, superadas pelas políticas adotadas pelos governos Lula e Dilma. É preciso reconhecer importantes recuos e a fragilidade das políticas de gênero, raça e diversidade sexual nos governos encabeçados por petistas em todos os níveis, inclusive recuo em programas de combate a homofobia, nos debates sobre os direitos reprodutivos das mulheres e sobre o aborto, na disputa contra a cultura machista.
56.Evidentemente, mesmo que tivéssemos feito o máximo entre 2003 e 2016, ainda assim as desigualdades e a exploração do conjunto da classe trabalhadora não teriam sido superadas. Um exemplo disto é a existência de salários diferentes para trabalhos iguais. Outro é o tempo gasto pelas mulheres com o trabalho doméstico não remunerado.
56.Os movimentos organizados de mulheres precisam incluir com destaque e centralidade total o trabalho de organização e de mobilização de mulheres das classes populares, em torno da luta por direitos iguais – por exemplo, pelo reconhecimento do trabalho doméstico não remunerado e pelo consequente direito à aposentadoria. Esta bandeira pode se constituir em ferramenta de “empoderamento” objetivo e subjetivo de milhões de mulheres da classe trabalhadora. Destaque-se, como prova deste potencial, o maior 8 de março da história do país em 2017, que mobilizou milhares de mulheres contra a antirreforma da previdência de Temer e dos golpistas.
57.O golpe de 2016, além de antinacional, antidemocrático e antipopular, é também machista, misógino, racista e LGBTfóbico. O programa golpista afeta brutalmente a vida das mulheres trabalhadoras, das jovens, das negras, das camponesas, das quilombolas e indígenas. O desemprego atinge primeiramente as mulheres e as jovens, o salário mínimo míngua, a maioria das categorias não conseguem reajustes salariais, programas sociais são desmontados ou tem grandes reduções de investimentos. Fazem parte da ofensiva golpista a antirreforma da previdência; as propostas legislativas em todos os âmbitos, que impedem o debate de gênero nas escolas; as ameaças de extinção da licença maternidade e a permissão para que gestantes possa trabalhar em locais insalubres, dentre outros aspectos da antirreforma trabalhista já aprovada; as investidas no sentido de excluir da legislação os casos de aborto hoje permitidos.
58.Por isso a agenda das mulheres precisa incluir com destaque o enfrentamento ao golpismo. Separar a luta das mulheres, da luta das mulheres trabalhadoras e da luta contra o golpe, contribuirá para a perda de todas as conquistas históricas. Esta separação é feita por setores liberais, pós-modernos e identitários do movimento de mulheres; e também é feita, por motivos opostos, por setores machistas da esquerda e da classe trabalhadora. Outro exemplo de postura sectária é a maneira como setores do movimento de mulheres tratam as lésbicas e as mulheres trans; e o principismo como abordam as demandas dastrabalhadoras do sexo. Para ajudar a combater tanto as posturas machistas, quanto as variantes liberais, pós-modernas e identitárias do feminismo, é tarefa prioritária a mobilização e formação das mulheres da classe trabalhadora.
59.Com base nestas diretrizes, o 4º Congresso da AE orienta a conferência nacional de mulheres da AE a aprovar diretrizes práticas de organização e atuação. Entre estas diretrizes, deve constar uma resolução que explicite nossa crítica às concepções atualmente hegemônicas na Marcha Mundial de Mulheres. A tendência petista Articulação de Esquerda nasceu defendendo a combinação entre socialismo e feminismo. Em todos os níveis e frentes de luta, há intenso protagonismo das mulheres militantes da AE. Por isto, temos autoridade para combater as posturas de vitimização e instrumentalização identitária, assim como o feminismo liberal. Tais posturas tem como resultado prático manter e as vezes fortalecer a influência do machismo entre as mulheres trabalhadoras.
60.Também entre as diretrizes que precisam ser debatidas e aprovadas pela conferência nacional de mulheres da AE, deve constar uma resolução criticando a política adotada pela secretaria nacional de mulheres do PT, seja na luta geral, seja na postura subalterna frente ao descumprimento da paridade na composição da CEN e outras instâncias.
A organização do Partido
61.Construído por milhões de brasileiras e brasileiros ao longo de 38 anos, o Partido dos Trabalhadores tornou-se o principal instrumento de luta da classe trabalhadora no país.
62.Alcançou esta condição ao contribuir para a organização e luta de todo tipo de movimento social em todo o Brasil, com destaque para a CUT, para o MST, para a CMP e para a reorganização das entidades estudantis, como a UNE e a Ubes.
63.Alcançou esta condição ao enfrentar a ditadura militar, a abertura controlada e a chamada Nova República reivindicando “Diretas Já!”, boicotando o colégio eleitoral, reivindicando uma Assembleia Constituinte exclusiva e soberana, votando contra o texto final da Constituição de 1988, fruto de uma manobra do chamado “centrão”.
64.Alcançou esta condição ao lançar a candidatura de um operário à Presidência da República em 1989, com uma estratégia que visava impor uma derrota ao conjunto do grande capital e implementar um programa de reformas democrático-populares articulada com o socialismo.
65.Alcançou esta condição ao se opor ao parlamentarismo e à revisão constitucional proposta pelos neoliberais no início dos anos 1990, oferecer dura resistência ao avanço neoliberal no Brasil e na América Latina e manter o socialismo como seu objetivo estratégico em meio à profunda crise que se abateu sobre o movimento socialista após a queda do Muro de Berlim e ao fim da União Soviética.
66.Alcançou esta condição ao vencer seguidamente todas as quatro eleições presidenciais realizadas no século XXI e exercer governos que ampliaram o bem-estar, a democracia e a soberania, tornando-se exemplo mundial de combate à fome e à pobreza.
67.Mas esta condição alcançada pelo PT, de principal instrumento de luta da classe trabalhadora, encontra-se hoje ameaçada pela combinação entre erros políticos cometidos por nós, com uma operação de cerco e aniquilamento orquestrada pelo grande capital em aliança com os partidos de direita, a mídia monopolista, movimentos ultraconservadores e a maioria do judiciário. Operação que visa não somente à desmoralização de Lula e do PT perante o povo brasileiro, mas à sua interdição, criminalização e destruição.
68.Por isso afirmamos: o PT vive a maior crise de sua história e corre risco de morte. Só reconhecendo isto poderemos adotar as medidas que impeçam o desfecho fatal.
69.A quem havia se iludido com os compromissos da grande burguesia brasileira com a democracia, com a domesticação do mercado financeiro e com a imparcialidade republicana do poder judiciário recomendamos abandonar quaisquer ilusões remanescentes sobre a disposição do golpismo em continuar a escalada do golpe, prender Lula e cassar a legenda do PT, ao que se seguiriam ataques ao MST, à CUT, à UNE e às demais organizações populares e de esquerda no país, inclusive os partidos que hoje fazem brutais acusações ao petismo e/ou pretendem herdar um suposto “espólio”.
70.Nossos inimigos de classe não descansarão enquanto não cumprirem com o objetivo manifestado em 2005: “acabar com a nossa raça”. Por isso insistimos: precisamos de um Partido para tempos de guerra. Mas não se constrói um Partido para tempos de guerra com uma estratégia baseada em “pactos” com as classes dominantes e pressupondo o funcionamento normal das instituições.
71.Portanto, além de subir o tom do discurso no enfrentamento ao golpismo; além de nos empenhar em conectar o discurso com a prática, construindo ações mais combativas, com base de massa e linha política correta; além de uma política de alianças que envolva apenas os setores comprometidos com a defesa do direito de Lula ser candidato, a revogação das medidas golpistas e o acúmulo de forças para a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte; além de adotar uma tática que priorize a mobilização social para garantir a inscrição, a campanha, a vitória e a posse de Lula presidente; em suma, além de uma reorientação tática, é preciso uma reorientação estratégica (ver a respeito a resolução aprovada pela primeira etapa do 4º Congresso da AE) e uma revolução organizativa.
72.A reorientação estratégica, para se materializar, depende da existência de um novo padrão de funcionamento do PT, uma vez que o atual padrão organizativo corresponde à uma estratégia que permitiu diversas vitórias mas não evitou nossa derrota. Precisamos sair da situação atual, de partido principalmente eleitoral que só funciona em anos pares, para partido organizador da luta da classe trabalhadora em anos pares e ímpares. Um partido auto-financiado, um partido com bases organizadas e direções que sejam efetivamente dirigentes, um partido com opinião e com meios de comunicação capazes de difundir estas opiniões, um partido presente na luta de ideias e na batalha cultural e, portanto, dotado de formação política e ideológica. Entre as medidas indispensáveis e urgentes, citamos:
- uma política de comunicação de massas que articule um jornal impresso nacional, revistas, rádio, televisão e redes sociais. Da situação atual, em que o PT ajuda a financiar o jornal Brasil de Fato, jornal que está sob a direção de outra organização política, devemos partir para uma nova situação, em que o PT construa sua própria imprensa petista de massas;
- reconstruir a rede de organizações de base e fortalecer as instâncias partidárias em detrimento dos centros de comandos paralelos localizados nos gabinetes parlamentares e executivos;
- organizar a atuação e a influência de massas do petismo entre os jovens, através de uma JPT militante e de massas, que supere seu profundo processo de dispersão e desorganização;
- retomar e massificar o trabalho de formação, da base às direções, com ênfase nos aspectos politico-ideológicos e teóricos;
- viabilizar o autofinanciamento do Partido, que não deve depender nem de recursos empresariais (como antes), nem do financiamento público (como agora).
73.O PT deve realizar, no ano de 2019, um processo congressual e a eleição de uma nova direção partidária. A atual direção adiou o plebiscito/referendo onde a base decidiria, pelo voto direto, se prefere manter o atual sistema eleitoral (chamado de PED) ou se prefere adotar outro sistema de eleição das direções. Na prática, apesar de nossos protestos, o mais provável é que a próxima eleição ainda ocorra sob o sistema do PED. Não é possível saber como se alinharão, frente aos desafios acima descritos, cada setor, tendência e liderança do Partido. Mas a tendência petista Articulação de Esquerda antecipa desde já sua disposição de ter chapa e candidatura em todos os estados do país, assim como em âmbito nacional. A vida tem demonstrado, e demonstrou de novo em 2017, que esta atitude contribui para evidenciar as questões que estão em jogo.
(...)

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